Após revelações nos EUA, investigação sobre Del Nero na Fifa avança

(Foto: Bruno Domingos / Mowa Press)


Documentos e depoimentos revelados durante o julgamento de José Maria Marin nos Estados Unidos serviram de base para o Comitê de Ética da Fifa reabrir uma investigação sobre o presidente da CBF, Marco Polo Del Nero. A Fifa é a única instância que tem o poder de banir o dirigente do futebol, caso prove que ele violou seu Código de Ética.

Desde maio de 2015 o presidente da CBF não sai do Brasil, país que não extradita seus cidadãos, e por isso não foi julgado nos EUA junto com Marin, Juan Angel Napout e Manuel Burga. No Brasil, Del Nero não é acusado de nenhum crime. Mas as dezenas de menções a seu nome em depoimentos, planilhas, gravações e outros documentos tornados públicos pela investigação americana levaram a Fifa a destravar um processo interno aberto há dois anos.

Nesta quarta-feira, os promotores do "Caso Fifa" afirmaram que Del Nero recebeu US$ 6,5 milhões em subornos para beneficiar empresas de marketing esportivo em contratos relacionados a Copa América, Copa Libertadores e Copa do Brasil. O presidente da CBF nega todas as acusações e afirma ser inocente.

Em dezembro de 2015, imediatamente após Del Nero ter sido indiciado pelo departamento de Justiça dos EUA por sete crimes (três de fraude, três de lavagem de dinheiro e mais um por integrar uma organização criminosa), o Comitê de Ética da Fifa abriu uma investigação interna, que pouco ou nada avançava. Até começar o julgamento em Nova York começar.

Todas as citações a Del Nero foram enviadas a Zurique. Em nota, a entidade afirmou que "não comenta processos em andamento". A Fifa se declarou vítima nos EUA e espera receber uma indenização assim que o julgamento for encerrado.

Procurado para falar especificamente sobre a investigação do Comitê de Ética da Fifa, Marco Polo Del Nero, informou que não poderia comentar, por se tratar de caso em andamento. Segundo o GloboEsporte.com apurou com pessoas que conhecem o caso, todos os documentos solicitados pela investigação foram enviados pela CBF.

Em todas as suas manifestações anteriores sobre o "Caso Fifa", Del Nero afirmou que "nunca participou, direta ou indiretamente, de qualquer irregularidade ao longo de todas atividades de representação que exerce ou tenha exercido". O presidente da CBF também declarou que "jamais foi membro do Comitê Executivo da Conmebol". Algo desmentido por documentos da própria Conmebol.

Uma ata de reunião do Comitê Executivo de 24 de outubro de 2012, realizada em Buenos Aires, lista Del Nero como um dos nove integrantes do órgão. José Maria Marin também participou da reunião, mas na qualidade de "convidado". O evento ocorreu sete meses depois de Ricardo Teixeira ter renunciado à presidência da CBF (onde foi substituído por Marin) e aos assentos que ocupava nos Comitês Executivos da Fifa e da Conmebol, onde foi sucedido por Del Nero.

Assim que foi indiciado, Del Nero chegou a se licenciar da presidência da CBF por alguns meses. Quando recebeu um sinal verde da Fifa, reassumiu a chefia do futebol brasileiro. Mas nunca voltou a sair do Brasil.

O nome de Marco Polo Del Nero, ou suas iniciais, apareceram em documentos apreendidos na Argentina e no Brasil. Na Klefer, agência de marketing esportivo com sede no Rio de Janeiro, foram encontradas anotações que indicavam pagamentos anuais de R$ 1 milhão em suborno para Marin e Del Nero, mais R$ 1 milhão para Ricardo Teixeira.

Este acordo seria referente ao contrato da Copa do Brasil, que também foi citado em conversas telefônicas gravadas entre o empresário J. Hawilla, dono da Traffic e um dos principais delatores do caso, e pelo menos dois de seus interlocutores: Kleber Leite, dono da Traffic, e José Maria Marin.

Outras referências a Del Nero apareceram em planilhas mantidas por Eladio Rodríguez, ex-funcionário da Torneos, empresa argentina que tinha os direitos de transmissão da Copa Libertadores e da Copa América. Rodríguez também declarou que pagava propina a Marin e a Del Nero.

O delator Alejandro Burzaco, ex-CEO da Torneos, contou que em 2012 a dupla Marin-Del Nero "herdou" uma pagamento anual de propina que antes era destinado a Ricardo Teixeira – outro ex-presidente da CBF (1989-2012) também acusado nos EUA de vários crimes. Tal qual Del Nero, Teixeira não sai do Brasil, nega as acusações e afirma ser inocente.

Durante todo o julgamento nos EUA, Del Nero foi alvo do "fogo amigo" de José Maria Marin, que é acusado dos mesmos sete crimes, com a diferença crucial de ter sido preso na Suíça e extraditado aos EUA. A defesa de Marin apontou Del Nero como o cérebro do futebol brasileiro e o responsável pelos atos de corrupção.

Nesta semana final do julgamento, um dos advogados de Marin tentou desqualificar a Fifa, ao reclamar que seu cliente foi banido do futebol, mas Del Nero continua no mesmo cargo que ocupava antes de ser indiciado – o de presidente da CBF.

– Quando Marin foi indiciado neste caso, muito antes de este julgamento começar, ele foi banido da Fifa. Eu gostaria de dizer que o sr. Del Nero, acusado dos mesmos crimes, continua em seu cargo e, por falta de uma palavra melhor, continua abençoado pela Fifa – disse Jim Mitchell, advogado de Marin, numa argumentação com a juíza Pamela Chen.

A juíza Chen respondeu que Mitchell não poderia usar esse argumento porque nem Del Nero e nem os critérios da Fifa estão em julgamento no Tribunal Federal do Brooklyn. E concluiu com uma ironia:

– Isso não prova nada. Quer dizer, prova que o sr. Del Nero tem mais amigos na cúpula [da Fifa].

Globo Esporte

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