Havia um sentimento de perda na Copa de 70 ou era obrigatório a vitória no mundial?


(Foto: Reprodução)

Por Nicholas Araujo
Redação Blog do Esporte


Na segunda parte do Especial “O Tri 50 Anos” conversamos com o professor Antônio Tadeu de Miranda Alves, professor do curso de História do Centro Universitário Salesiano de São Paulo (Unisal), sobre algumas curiosidades e detalhes da Copa do Mundo de 1970.

De acordo com Alves, o sentimento na época era de reverter a perda do troféu da Copa de 1966, que até então foi um fiasco para a seleção. Mesmo com a ditadura instalada no país, o sentimento de “vingança” e de consolidar o futebol brasileiro no cenário mundial era importante. Principalmente pela seleção ter Pelé, que já era uma grande estrela e um dos destaques dos últimos mundiais.

Confira a entrevista:

Nicholas Araujo: Por que o elenco de 70 é considerado, por muitos, como o melhor da seleção brasileira?

Antônio Alves: As comparações são complicadas. O elenco de 70 era, de fato, muito bom, com jogadores de grande qualidade, tanto pessoal quanto para o trabalho em equipe. Mas se dizemos que é o melhor, sem querer colocamos em nível menor os elencos de 1982, de 2000 e outros. Talvez a de 70 faça a diferença pela presença de Pelé – que é um jogador “fora da curva”.

Nicholas: Na sua opinião, é possível dizer que a seleção venceu a copa pela visão de Zagallo como técnico?

Antônio: Sem dúvida que Zagallo orientou a equipe muito bem, mas há outros fatores. O Brasil havia perdido a Copa de 66, quando Pelé foi vergonhosamente “caçado” em campo. Havia então um sentimento silencioso de revanche, de vamos vencer porque temos direito. Neste clima, todos os jogadores se apresentaram muito empenhados e decididos a vencer, entrosados nas jogadas e no propósito, ajustando-se às orientações do técnico com toda disciplina.

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Nicholas: O que falta para a seleção, atualmente, se equiparar à seleção de 70?

Antônio: Sem querer fugir da pergunta, as comparações são difíceis de serem feitas. O contexto do futebol mundial atualmente é outro. Há um caráter profissional, de negócio, muito acentuado. Os jogadores sofrem pressão enorme por conta de seus contratos de valores estratosféricos. Outro aspecto é a forma de jogar, propriamente dita. A velocidade das jogadas aumentou, o preparo físico dos atletas é muito mais acentuado. Em outros tempos, a cadência das jogadas era mais lenta, o jogador tinha mais espaço para trabalhar a bola.

Nicholas: Quais são as principais curiosidades desta Copa?

Antônio: Não é possível escapar dos gols que Pelé não marcou. É isso mesmo – os gols que Pelé não marcou. O chute longo, do meio do campo, com a bola caindo devagarinho e quase, mas quase, encobrindo o goleiro da Tchecoslováquia. O movimento de corpo que faz sobre o goleiro do Uruguai, quando deixa a bola ir para um lado e Pelé vai para outro, deixando o goleiro perdido entre os dois... e a bola passa raspando o travessão. Ou a surpreendente cabeçada, numa tentativa de superar o goleiro Banks, reconhecido como o melhor do certame. Quando todos cabeceariam para encobrir o goleiro, o que seria fácil para este agarrar a bola, Pelé cabeceou para baixo, com força. Quase.

Nicholas: A seleção venceu a copa por ter Pelé ou pelo conjunto todo?

Antônio: A seleção venceu a copa pelo conjunto formado por excelentes jogadores, disciplinados, ajustados, empenhados. Para o azar dos adversários, esse conjunto ainda contava com Pelé.

Nicholas: Vencer a copa seria uma honra para a seleção em tempos de ditadura?

Antônio: Na verdade não havia, pelo que me parece, este sentimento. Creio que o sentimento maior era recuperar o troféu perdido em 66. Mesmo o Estado Ditatorial, veio perceber que poderia explorar muitos frutos a partir da vitória só posteriormente. Por outro lado, vencer uma copa é sempre uma honra, desperta um sentimento nacionalista, pois o torneio é feito entre as nações.

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Nicholas: Quem é o personagem mais importante desta copa?

Antônio: Sem dúvida que é Pelé. Já era conhecido internacionalmente como um dos melhores jogadores, passou a ser tratado como o melhor de todos os tempos. Havia ainda uma possibilidade, um certo suspense, de que Pelé ia parar de jogar em copas do mundo, mas acabou convencido de participar desta, como pela última vez, o que de fato aconteceu.

O campeonato mundial de futebol é uma marca de humanidade para todos os tempos. Assim como outros torneios esportivos, é o lugar e tempo em que os homens procuram colocar o seu melhor, promovendo as relações esportivas, em que as regras são obedecidas e o tratamento dado ao adversário é respeitoso. O futebol é um esporte bonito, de grande beleza plástica, com lances que surpreendem e emocionam, desde o verde do gramado, da alegria da torcida, aos dribles e gols. A Copa de 70 é prova disso.

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