"Maracanã do tênis" confunde torcida e causa surpresa em atletas: "É louco"

(Foto: Thierry Gozzer)


O formato oval, semelhante ao do Maracanã, a céu aberto, ao contrário da maioria das arenas, faz da quadra central do Complexo Olímpico de Tênis um ambiente familiar. As bandeiras de vários clubes brasileiros espalhadas pelas arquibancadas também remetem ao futebol. Quando a bola começa a pingar, porém, deveriam prevalecer as regras do esporte em disputa. Nada de barulho ou movimentos bruscos. São situações comuns para o circuito de tênis, mas que o público da Olimpíada do Rio de Janeiro, acostumado com o clima futebolístico, tem estranhado e por vezes ignorado, principalmente quando estão em quadra os brasileiros ou os ídolos mundiais. 

A adaptação a passos lentos protagoniza cenas inusitadas durante as partidas e reações muitas vezes exageradas. O comportamento caloroso, com gritos até em momentos inapropriados, causa surpresa também nos tenistas. Para torcedores e atletas, trata-se de uma experiência nova. 

O que mais chama atenção são as filas que se formam a cada game nas portas de acesso às arquibancadas. Quando o torcedor deixa o seu lugar para comprar comida, bebida ou ir ao banheiro, ele normalmente tem uma "surpresa" na volta. O retorno à cadeira  só é permitido ao fim de cada game. As pessoas vão chegando e se aglomerando. Algumas até acham que é proibido passar por ali. Outras esticam o pescoço na tentativa de dar uma espiadinha.

- As pessoas estão se educando durante o torneio. Muita gente reclama ainda. De dez, três reclamam, tentam dar o jeitinho brasileiro, pedindo para deixar passar, mas não pode. E eu também aviso as pessoas, quando elas saem, para saber que vai ter de esperar na volta. Alguns já chegaram a falar que no futebol é diferente. Estão aprendendo aos poucos, é um público diferente - comentou Márcio Diniz, um dos funcionários da Rio 16 responsáveis por auxiliar no "entra e sai" da arquibancada.  

No primeiro andar da arena, principalmente nos corredores logo atrás da quadra, para onde o tenista olha na hora do saque, o controle é ainda mais rígido, com a presença de integrantes da força nacional. Apenas quando acontece uma pausa maior, a entrada é liberada. Aí é aquela correria para chegar ao lugar. 

Enquanto as portas ficam fechadas, os torcedores precisam esperar de pé o tempo que durar o game, com copos, sanduíches e pipoca na mão, acompanhando a partida apenas pela reação de quem assiste à partida. A prática é comum ao circuito, principalmente nos grandes torneios, mas surpreende quem não está acostumado com o mundo do tênis. 

- É novidade para mim. Eu costumo ir nos jogos de futebol e circular livremente sempre quando quero. Aqui tem que esperar. É se acostumar. O jeito é ficar aqui e aguardar a porta abrir para voltar para o lugar. Já vi tênis ao vivo em alguns lugares, mas não conhecia essa situação. Faz parte, tem de respeitar - disse Rafael Alves de Oliveira, advogado de 36 anos. 

As manifestações de apoio às vezes também saem do padrão do tênis. São gritos fora de hora, perto do movimento do saque, que exigem dos juízes e das juízas constantes pedidos de silêncio. Não faltam, também, menções ao futebol. O tradicional "Vai, Corinthians", cantos de estádios, como "Olê, olê, olê, olá, Rafa, Rafa (Nadal) e até provocações entre brasileiros e argentinos já foram presenciados na quadra central nos primeiros quatro dias de disputa. 

- Às vezes é um pouco exagerado. Contra o Brasil, foi uma coisa muito louca, nunca tinha visto. É bem diferente do comportamento do circuito. Não chega a atrapalhar, mas é um público diferente - afirmou o italiano Andreas Seppi, que na última segunda enfrentou e venceu os brasileiros Thomaz Bellucci e André Sá ao lado do compatriota Fábio Fognini nas duplas. 

Quando o tenista é da casa, a empolgação é ainda maior, e o caldeirão ferve para valer. No jogo entre Thomaz Bellucci e o uruguaio Pablo Cuevas, na noite de terça-feira, os torcedores deixaram o protocolo de lado e jogaram junto: vibraram demais, independentemente da hora, comemoraram antes mesmo de Bellucci matar o ponto, reclamaram de marcações do juiz e vaiaram o uruguaio diversas vezes - além de chamá-lo de alguns termos pejorativos. Também houve um princípio de confusão no fim, e dois uruguaios precisaram ser retirados pelas forças armadas. Depois da derrota por 2 sets a 1, o uruguaio ironizou ao dizer que não se incomodou com os brasileiros, apesar de falado com a arbitragem sobre o assunto em determinados momentos. 

- Não escutei a torcida brasileira. Só ouvi os uruguaios. Não pretendo associar a derrota à torcida. Já tinha passado por essa situação com a torcida na primeira partida. Foi um jogo resolvido em quadra. O que veio de fora não influenciou. 

Apesar de favorecido, Bellucci admitiu que, se estivesse do outro lado, ficaria incomodado. Mas como está em casa, espera aproveitar a atmosfera positiva cada vez mais.

- Eu não queria estar na pele do Pablo (Cuevas). É difícil o cara o do outro lado não se irritar um pouco com a torcida, mas acho que a torcida foi muito respeitosa. É complicado jogar com tanta torcida contra. Joguei assim no Uruguai, na Argentina. A energia que eles passam para mim é muito grande. Para o outro, cada ponto que perder, sabe que a torcida vai infernizar, cair para dentro da quadra. É uma sensação diferente. A vantagem de jogar em casa é grande e até agora temos usado bem essa situação. 

Globo Esporte

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